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Primeiro de Agosto

Estamos aprendendo a lidar com o viver nas incertezas, apesar de ainda fingirmos que sabemos para onde estamos indo. Acreditamos que somos separados de tudo e de todos, por isso vivemos em permanente negação.

Vou destrinchar o parágrafo acima:

“Estamos aprendendo a lidar com o viver nas incertezas…”

Estamos definitivamente na era das incertezas. Estamos acostumados a acreditar que as coisas estão sob controle, seja individualmente ou coletivamente. A cada dia que passa, percebemos que tudo aquilo que acreditávamos está sendo questionado, está sendo chamado a ser repensado. Ao mesmo tempo, temos a tendência de ficarmos presos às nossas crenças e valores, mesmo que as evidências apontem em outra direção. Com as constantes mudanças que temos vivido nos últimos anos (para cada um, o número é diferente), a reação de cada pessoa às informações, desinformações e múltiplas explicações são geradoras de incertezas. Alguns preferem escolher uma explicação e ficar radicalmente a defendendo, outros buscam se informar melhor e aceitar melhor as incertezas. Diz um provérbio popular: “Quando os ventos da mudança surgem, uns constroem abrigos… outros moinhos.”

“… apesar de ainda fingirmos que sabemos para onde estamos indo.”

Temos muita dificuldade em caminhar pelo desconhecido, por aquilo que não conseguimos dar uma explicação. Por isso existem tantos mitos que rodeiam nossa cultura. Acreditamos que precisamos saber que estamos no controle dos nossos pensamentos e ações, acreditamos que a nossa realidade é a realidade. Como isso nos sentimos seguros, mesmo que para isso precisemos acreditar numa narrativa bem fantasiosa. Temos a necessidade de nos sentirmos pertencendo, aceitos. Fazer parte de um grupo (tribo) que nos acolhe, desde que sigamos suas regras de crenças e condutas. Isso nos leva a fazer escolhas do coletivo ao invés de escolhas coletivas.    

“Acreditamos que somos separados de tudo e de todos…”

Somos interdependentes, somos interligados a tudo e a todos, somos um por assim dizer. No entanto insistimos em separar, separar e separar. Em algum momento histórico acreditamos que seria mais fácil ver tudo separado para não ter que lidar com o caórdico, com o caótico. Estamos gastando muito tempo e energia para voltar a noção da complexidade em que vivemos. Essa visão sistêmica incorpora a incerteza e todas as variáveis que compõem a vida como ela é. Ao separarmos teremos sempre o nós e o eles, o certo e o errado, o bom e o mal e perdemos de vista que essas polaridades são parte do todo. São lados (dualidades) do mesmo bastão. A computação funciona com esse princípio da dualidade. Para tudo que fazemos num computador existe apenas o ligado e desligado (0 e 1). Literalmente é isso, as combinações entre essas duas partes formam o todo. Parece metafisico, mas é muito simples e ilustra bem nossa tentativa desastrosa de separar o que funciona bem junto. A medicina é um outro bom exemplo. Se você separar algum órgão do corpo, ele deixará de funcionar como deveria. Apesar disso ainda se insiste em ter especialistas que procuram resolver uma parte sem olhar para o todo integral, funcional.   

“… por isso vivemos em permanente negação.”

Negamos o outro, sua cultura, suas crenças, seus valores, sua origem, sua verdade, sua cor, suas escolhas. Negamos a natureza como se não fossemos natureza. Negamos porque aprendemos a negar o que não somos, o que não temos, o que nos amedronta.

Podemos reaprender que podemos viver com o que a vida nos oferece. Que tudo bem não saber. Que podemos viver em colaboração. Que podemos aprender e amar com o diferente, com o que temos e com nossos medos.

Vou escrever novamente o primeiro paragrafo e espero que as palavras sejam mais significativas do que na primeira leitura:

Estamos aprendendo a lidar com o viver nas incertezas, apesar de ainda fingirmos que sabemos para onde estamos indo. Acreditamos que somos separados de tudo e de todos, por isso vivemos em permanente negação.

O Homo Sapiens tem a capacidade de acreditar em coisas que não existem. Com isso, segundo Yuval Harari, ele conseguiu criar comunidades cada vez maiores e controladas por essas… fantasias. O que nos faz acreditar no inacreditável? O que nos faz acreditar nas narrativas imaginadas por quem controla os bandos, as empresas, as cidades, os estados e os países separados por linhas imaginárias. Essas ficções são cada vez mais sofisticadas e agora querem nos levar ao Metaverso que o Zuckerberg quer nos fazer acreditar que é dele. No meu tempo chamavam isso de vaporware. Novamente indico a fala do Yuval em Londres no TEDx em junho de 2005.

Todo dia, toda hora alguém cai numa ficção (oficial ou não) que os de fora riem dos trouxas que acreditaram no mito. Como respondia, brilhantemente, o Joseph Campbell quando perguntado o que era Mitologia: “Mitologia é a religião dos outros.” Há centenas de exemplos uns mais engraçados que os outros, claro que quando não somos nós que acreditamos neles. Pensei em colocar um exemplo icônico nesse texto. Nada de grupos como os qu e acreditam que a Terra é plana ou os QAnon. Pensei em exemplos como o da Theranos da Elisabeth Holmes, Realfooding do Carlos Ríos, Knoedler Gallery com a Ann Freedman, Quadriga do Gerald Cotten e tantos outros. Escolhi a Juicy Fields, uma empresa que prometia fazer o seu dinheiro render através de plantações de maconha. O negócio parecia tão rentável que uma grande quantidade de investidores caiu nessa ficção. Mesmo tendo muitos textos e vídeos denunciando que era uma fraude, teve gente que acreditou. Vale a pena ler a história publicada no El País em espanhol ou inglês.

Bruno Pereira e Dom Phillips continuam a gerar consciência mundial sobre as atrocidades cometidas pelo atual governo na destruição da Amazonia e dos povos que a protegem. O pedido de demissão de mais um interino a frente da Funai na Terra Indígena do Vale do Javari revela a precariedade de condições de segurança da região. O presidente da Funai, o delegado da Polícia Federal Marcelo Xavier, inacreditavelmente, nunca foi a região. O governo (ou desgoverno) respondeu a CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos) sobre as medidas cautelares das mortes de Bruno e Dom, omitindo o trabalho dos indígenas locais nas buscas (mencionados em meu texto anterior) e deixando de fora o fato de que o Bruno vinha sendo ameaçado.  

Estamos há 159 dias da invasão Russa na Ucrânia e o mundo continua passivo.

Estamos entrando no 32º mês da presença do COVID-19 e ainda não temos respostas para as perguntas básicas. Alguém sabe dizer de onde o vírus se originou, quais cientistas estavam certos, resultados de cada vacina, quem agiu criminosamente ou qualquer outra pergunta? Cada um de nós acredita que estamos certos e os outros estão errados. Voltamos a Mitologia do Campbell. Hoje a França liberou completamente as medidas de restrições ao COVID-19. Estamos confirmando a endemia no lugar da pandemia?  

Sobre tudo isso que escrevi acima, recomendo fortemente a leitura do livro “The Coronation” de Charles Eisenstein que saiu há quatro dias (28/07). Trata-se de uma compilação de artigos que escreveu sobre a pandemia e, o mais impressionante, é a atualidade desses textos. Ouvi o livro narrado pelo próprio Charles, são quase 5h53 minutos que passam bem rápido nas caminhadas e momentos de “leitura”. Em julho Charles escreveu 4 textos que merecem ser delicadamente saboreados. A leitura de cada um deles varia de 10 a 15 minutos, e também podem ouvir a versão em áudio lida pelo Charles:

Pandemia 1https://charleseisenstein.substack.com/p/pandemania-part-1

Pandemia 2https://charleseisenstein.substack.com/p/pandemania-part-2

Pandemia 3https://charleseisenstein.substack.com/p/pandemania-part-3

Pandemia 4https://charleseisenstein.substack.com/p/pandemania-part-4

Texto no site de Charles Eisenstein sobre seu novo livro “The Coronation”:

“Meu livro mais recente compila minha melhor escrita da era Covid, com um prólogo, epílogo e mini introduções adicionados a cada ensaio. Inclui e tem o nome do meu ensaio de abril de 2020, “The Coronation”.

Desde o fim amorfo da pandemia, o Covid afundou parcialmente no inconsciente político. Questões anteriormente polêmicas não são mais tão politicamente carregadas, não são mais tão carregadas de dinâmicas sociais de identidade e pertencimento. Isso significa que as pessoas estão prontas, talvez, para expandir sua criação de sentido e significado em torno do Covid.

Meus ensaios em 2020 e 2021 foram além de articular uma posição contrária sobre as questões do dia. Sim, engajei criticamente as questões atuais, mas sempre com o objetivo de incorporá-las em um quadro maior. Portanto, nenhum dos ensaios é datado; se alguma coisa, eles são mais relevantes hoje do que nunca, à medida que as paixões e lealdades da era Covid diminuem. Infelizmente, grande parte da nuance e complexidade do que eu estava dizendo foi abafada na época por uma tempestade de forças sociais e psicológicas primordiais: histeria e contra-histeria, conformidade irracional e desafio reflexivo, moralidade da multidão e psicose em massa, medos de morte não processados e ressentimentos sociais latentes.

Agora, à medida que a tempestade passa, estou sentindo uma nova abertura para o que ofereci. Portanto, juntei meus ensaios relacionados ao Covid de 2020 e 2021 neste livro, mapeando um arco social externo e psicológico interno da pandemia. Acredito que, com um pouco de distância, The Coronation ajudará um projeto vital de construção de sentido nos próximos anos. Sim, vital. Eu sinto uma sensação de urgência em torno deste livro. As forças sociais que surgiram durante a pandemia ainda fervilham sob a superfície. A maquinaria ideológica que os explorou ainda está intacta, e suas tecnologias de controle associadas estão mais desenvolvidas do que nunca. A história pode facilmente se repetir de maneira ainda mais extrema, se permitirmos.

No meu ensaio inicial sobre Covid, “A Coroação”, descrevi a pandemia como uma iniciação: uma interrupção na normalidade que revelaria o que se escondia dentro e entre nós, que nos enfrentaria com novas escolhas e exigiria de nós novas capacidades. Uma coroação, eu disse, é uma iniciação à soberania, onde escolhas até então inconscientes se tornam conscientes. O Covid iluminou para onde estamos indo: um mundo alienado, trancado, tecnologicamente mediado, ideologicamente polarizado, autoritário e medicalizado sob controle cada vez mais intenso. Essas tendências não começaram de repente em 2020. Agora que vimos claramente nosso destino, não é mais inevitável. Podemos escolher outro com base no que consideramos sagrado.

The Coronation baseia-se em várias narrativas de Covid concorrentes sem ser escrava de nenhuma delas. Em um ponto de 2020, eu disse em um podcast em algum lugar que só seríamos capazes de entender o Covid quando cada um de nós deixar de lado pelo menos uma crença muito arraigada sobre isso – uma crença, talvez, que uniu a realidade. Porque, seja a realidade ortodoxa total delimitada pelas autoridades de saúde pública, Facebook, Twitter, os verificadores de fatos e a grande mídia, ou o universo alternativo conspiratório mais rebuscado, ou algo entre esses extremos, a realidade do Covid que habitamos foi forjado não apenas a partir de evidências e razões. Agora que algumas das paixões diminuíram, podemos começar a remontar os fragmentos do velho normal despedaçado em uma nova compreensão sã e coerente. A Coroação visa servir a esse processo. Certamente não responde a todas as perguntas sobre a pandemia – como poderia, quando novas revelações aparecem praticamente a cada dia? Mas posso prometer a você que trará nova clareza e ação a pelo menos uma pergunta: que mundo devemos escolher agora?”

Encerro o texto de hoje com a terceira leitura do primeiro parágrafo:

Estamos aprendendo a lidar com o viver nas incertezas, apesar de ainda fingirmos que sabemos para onde estamos indo. Acreditamos que somos separados de tudo e de todos, por isso vivemos em permanente negação.

Primeiro de Julho

Luz no fim do Túnel?

Esse mês de junho foi muito… muito intenso. Foi um daqueles meses que parecem um ano inteiro. A começar que estou escrevendo essas linhas com covid no meu organismo, testei positivo há três dias.

Desinformação

Quanto ao covid19, me lembro de várias vezes ter escrito questionando nossa percepção em relação aos números publicados por cada país, aos tratamentos recomendados, a origem do vírus, a eficácia de cada vacina, as medidas de prevenção, compensações econômicas, benefícios escusos, políticas antiéticas e as decretações do fim da pandemia, começando pela Dinamarca no dia primeiro de fevereiro desse ano. Passados dois anos e meio continuamos sem respostas para nenhuma dessas questões e as divergências são tão antagônicas quanto (ambas) cientificamente comprovadas. Resta ao cidadão se conscientizar de que não existe o certo e o errado e sim a falta de informação, a desinformação e a informação. Sendo a desinformação a mais usual, porque é atraente para quem lê, vem travestida de informação, gera muitos negócios e tem a garantia de impunidade para quem a produz. A falta de informação não é atraente, reflete um certo fracasso, gera demanda por informação (geralmente preenchida, oportunisticamente, por desinformação) e ao seu favor conta apenas a honestidade. Quanto a informação é uma joia rara que se confunde facilmente com bijuteria. A informação é geralmente mais inacreditável do que a desinformação, não tem apelo (appeal) e a narrativa (por não ter sido construída) não cola. Portanto estamos bem, correto? Bem mal!

A arte da desinformação tem método, intenção e patrocínio. Ela não é nova, sempre existiu. Para que ela funcione bem é preciso que por um lado se anuncie que o rei nu está vestido e por outro oferecer pão e circo. A vantagem que a desinformação tem é que a grande maioria acredita e deixa quem não acredita numa situação constrangedora.

Uma das estratégias, hoje bem conhecida é de após fabricar essas fake news, eles procuram espalhar através dos seus milhares de micro funcionários para tentarem se destacar junto aos chamados “inocentes uteis”. Eles são em geral os influencers (influenciadores) que na verdade são apenas intermediários. Eles não produzem notícias, repassam aquelas que estão “bombando”. Com isso o público deles (cada vez maior) tem a sensação de que são eles que fizeram a notícia “bombar”. Tem muitas outras estratégias conhecidas.

O caso da desinformação sobre o ator francês, Alain Delon, ter decidido realizar seu suicídio assistido divulgado em abril desse ano no mundo inteiro, ajuda a ilustrar essa ideia. Foi uma fake news, como tantas, que fez centenas de milhares de fãs acreditarem que ele tinha morrido e ou que tinha marcado seu suicídio com o acompanhamento do seu filho. A fabricação é simples, alguém pegou um trecho de uma entrevista dele e outra do filho e tirou completamente do contexto, acrescentaram que o ator se mudou para a Suíça porque lá a eutanásia é legalizada. O resto da mídia foi na onda e replicou a bobagem, o assunto viralizou nas redes sociais e até hoje tem gente acreditando que isso seja verdade. As vezes acontece um acidente como no jornal Folha de São Paulo que no dia 11 de abril (e não 1º de abril) anunciou, na internet, a morte da Rainha Elizabeth: “Morre Elizabeth 2ª, a mais longeva rainha da história britânica, aos XX” com o subtítulo: “Discreta, soberana deixa como maior legado confiança na monarquia”. A situação viralizou nas mídias sociais em que os títulos eram versões de “Folha Mata Rainha da Inglaterra”. Nesse caso da Folha, não foi uma desinformação deliberadamente montada, na verdade é um caso de falta de informação – não sabemos como e porque ocorreu essa gafe. Tudo bem!

Bruno Pereira e Dom Phillips

No dia primeiro de junho, eu estava conduzindo uma conversa num evento híbrido paralelo a Stockholm+50 pela SOL (Society for Organizational Learning) de Estocolmo. A conversa foi com o líder indígena Almir Suruí (Rondônia) e uma inédita visita virtual a aldeia Maronal, no Vale do Javari, onde o Cacique Alfredo Maronal descrevia para o publico em Estocolmo e no Zoom as principais ameaças à vida dos povos locais e à floresta Amazônica. A situação descrita (in loco) chocou os participantes estrangeiros a nossa realidade. Parecia tão inacreditável, que muitos confessaram depois, achavam que estavam exagerando. Não era possível, nos dias de hoje, que isso fosse permitido e pior… até incentivado. Quatro dias depois – simbolicamente – no dia 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, definido por causa do primeiro evento internacional sobre o meio ambiente há exatos 50 anos em Estocolmo, desaparecem dois importantíssimos ativistas da causa humanitária, exatamente na região próxima a aldeia Maronal, no mesmo rio (Ituí/Itaquaí) e na mesma cidade (Atalaia do Norte) mencionada pelo cacique Alfredo. Aliás, Bruno e Dom estavam em Atalaia do Norte nesse mesmo dia 1º enquanto, próximo dali, estávamos numa roda de conversa híbrida com cerca de 40 pessoas de 15 países diferentes. O jornalista inglês Dom Phillips estava entrevistando lideranças indígenas para seu livro “Como Salvar a Amazônia”.  

Foi só na segunda-feira, dia 6, que o mundo acordou com a notícia do desaparecimento e durante a semana uma parte do mundo acordou para a (ir)realidade dos crimes contra a humanidade cometidos na Amazônia. O que se seguiu e continua até hoje são cenas do horror que os povos da floresta vêm enfrentando, principalmente, nesses mais de três anos.     

Esse encontro que conduzi em Estocolmo contou a ajuda de muita gente e principalmente com a FAS (Fundação Amazonia Sustentável) liderada pelo amigo Virgílio Viana que vem, entre tantas outras coisas, viabilizando pontos de inclusão digital nos pontos mais remotos da floresta Amazônica e da indígena Rosa dos Anjos responsável pela área indígena da FAS, amiga de Bruno Pereira. Essa empreitada parecia tão impossível, principalmente porque nunca tinham feito uma comunicação por Zoom e não estavam conseguindo se conectar. No dia anterior tentamos fazer um teste, fiquei com a sala aberta aguardando que pudessem conseguir entrar. Até as 23h não tinham conseguido e não havia como me comunicar com eles. Para completar recebi a informação que a Txai Suruí não tinha conseguido embarcar no translado e que não chegaria a tempo em Estocolmo para participar com a Adri Maffioletti que ia ser (e foi) a host e tradutora no lado presencial em Estocolmo. Fui dormir pensando no texto que mandaria avisando que não ia rolar o encontro. Logo cedo, cedo mesmo porque as atividades começavam em Estocolmo às 9h (4 da manhã no Brasil) o Zoom me mandou uma mensagem que tentaram entrar a meia noite na sala, ou seja, havia esperanças e para melhorar ainda mais o Cacique Almir Suruí se ofereceu para participar substituindo sua filha Txai. Estava parecendo que conseguiríamos realizar essa façanha. A Adri Maffioletti foi uma host maravilhosa, transbordou simpatia, alegria, competência na tradução para o inglês, conhecimento profundo da causa indígena brasileira principalmente da necessidade de um ativismo mundial da qual é uma das expoentes do Fridays for Future e MAPA (Most Affected People and Areas). Recebemos, no dia do evento, um vídeo com depoimento do líder Pedro Marubo em sua língua nativa:

Depoimento de Pedro Tamasaimpa Marubo fala: “Nós defendemos a nossa floresta e nosso território não é simplesmente para morar. Ela nos oferece recursos naturais como por exemplo: Ervas e plantas medicinais, lagos, igarapés e matas que nos oferece peixes, caças sem fim. Por esta razão, defendemos nosso chão porque, a terra para nós povos indígenas é o melhor que governo, ela nos dar tudo que precisamos. Enquanto governo nos tira nossa terra apoiando garimpo, fazendeiros e madeireiros. A chegada da internet na nossa aldeia é muito importante para todos nós. Os nossos filhos terão conhecimento científico-tecnológica do homem branco e vamos juntar com nossos conhecimentos tradicionais nós também participaremos das reuniões que acontecerão longe nas cidades através de videoconferências e outros assuntos do nosso interesse que serão discutidos pelos políticos muitas vezes homem branco discutem sem a nossa participação agora podemos falar direto da nossa aldeia sem ter que sair, vocês chegam até nós para nos ouvir e buscar nos ajudar.”

Sugiro fortemente que vejam esses importantes links para entrarem mais profundamente nas questões sistêmicas rodeando Bruno e Dom.

The Guardian em inglês (entrem também nos links):

Agência Pública (vários artigos):

Vozes do Planeta (Paulina Chamorro)

Roda Viva (Sydney Possuelo)

Stockholm+50

Provavelmente a Suécia, num futuro muito próximo, vai se envergonhar profundamente do que fez e principalmente do que não fez nesse evento que deveria ter sido o mais significativo dessa década. Ela conseguiu desmobilizar de tal maneira que se torna quase impossível tirar alguma coisa de boa dela. Acompanhei integralmente ao vivo no dia 2 e 3 de junho (as datas já são parte da vergonha) e fui vendo as gravações ao longo da semana seguinte. O país de Greta Thunberg e de Johan Rockström não poderia ter feito isso com a memória da Estocolmo 1972 e dos 50 anos de tudo que foi gerado de encontros, documentos, decisões e acordos de sustentabilidade. A reunião preparatória de 28 de março na ONU em Nova York já anunciava o fracasso e não teve qualquer esforço de minimizar (ou mitigar) os resultados negativos. Como todo evento da ONU, o que fez valer a pena de ir a Estocolmo foram os eventos não oficiais promovidos pela sociedade civil. Parece que depois de 50 anos ainda não aprendemos de que a ONU, os governos e as empresas não deveriam mais serem convidadas a participarem de encontros tão importantes. Há honrosas exceções como o Protocolo de Montreal e outros que geraram resultados. Num dos eventos laterais que participei era sobre porque as ODS não emplacaram e suas implicações na política. Esse mês deve sair um livro sobre um estudo profundo apresentado no evento “The Political Impact of the Sustainable Development Goals“ lançado pela Cambridge University Press e pode ser baixado gratuitamente

Os jovens e os povos originários foram os responsáveis pelas principais atrações e movimentos ativistas. Esperamos que tenhamos melhor aproveitamento na nossa Cúpula dos Povos na Rio+30 em outubro desse ano.   

Tempo Quente

Um dos grandes presentes de junho foi o lançamento do Podcast “Tempo Quente” (Radio Novelo) que foi lançado em 7 de junho com o episódio “Alerta Vermelho” e a inacreditável história do “carvão mineral sustentável” contada deliciosamente pela jornalista Giovana Girardi.

https://www.radionovelo.com.br/tempoquente

No episódio dessa semana “Amazonia sitiada”, sem dar spoiler tem uma deliciosa linha do tempo contada com amor, humor e responsabilidade socioambiental. Adorei a mini participação do Tasso Azevedo (MapBiomas) e do Claudio Angelo (Observatório do Clima)

Gostei também da Giovana ter colocado o Delfim Neto no local que ele merece ao invés de reverenciá-lo, como o fazem algumas mídias. Uma das pérolas ditas por ele é de que “a Trans Amazônica é a coisa mais fake news que já se construiu no Brasil”. Olha só quem fala!

Vida longa ao Tempo Quente!

Luz no fim do túnel nas eleições 2022

Depois de tantos mandos e desmandos para sistematicamente destruir a democracia, acredito que podemos vislumbrar alguma luz no fim desse escuro, violento e corrupto túnel. O assunto não poderia ser eleição presidencial, não há o que dizer apesar de todos não pararem de falar.

Amanhã, 2 de julho, o Meio Ambiente tem o prazer de anunciar a pré-candidatura de Marina Silva para Deputada Federal por São Paulo. Quem for de outro estado, pode contribuir pedindo a um amigo ou parente de São Paulo votar nela. Além de Marina Silva existem outros que defendem a democracia e a pauta socioambiental. Esperamos que tenhamos cada vez bons políticos eleitos.

Espero que políticos como os que estão causando os problemas na Amazônia, por terem aberto a porteira aproveitando a pandemia, recebam poucos votos dos cidadãos desinformados.

Enquanto isso…

Presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, bem próximo ao presidente da república é acusado de assédio sexual e pede rapidamente demissão.

O ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro foi preso.

Na Colômbia, Gustavo Petro, vence a eleição. Uma esperança?   

Encontro do G7 nos Alpes da Bavária (Alemanha)

128 dias de invasão Russa na Ucrânia

Terremoto no Afeganistão

Greta Thunberg aparece de surpresa no Festival de Glastonbury

Terminou ontem a Cúpula da OTAN

Mesmo com tudo isso vemos uma luz no fim do túnel… só esperançamos de que não seja um trem!

Primeiro de Junho

Adri Maffioletti

Hoje é, antes de mais nada, o aniversário de dois anos da minha neta. Razão de ser de tudo que faço para um planeta melhor.  Nossas ações de hoje são para as futuras gerações.

Hoje foi um momento histórico num evento em Estocolmo celebrando os 50 anos da primeira conferência da ONU. O encontro contou com a presença da jovem indígena ativista Adri Maffioletti que liderou a conversa e traduziu para o público local as vozes das lideranças indígenas da Amazonia do distante Vale do Javari (Aldeia Maronal do povo Marubo) e do Cacique Almir Suruí da Terra Indígena Sete de Setembro, em Cacoal, Rondônia. Txai Suruí, que foi a primeira indígena a fazer um discurso (notável) na abertura de uma COP (COP26 Glasgow), também deveria estar presencialmente nesse evento em Estocolmo, mas seu voo atrasou muito e não conseguiu chegar. Seu pai, Almir Suruí, falou da situação crítica da região pelo desmatamento e grande pressão da mineração, muitas vezes incentivado pelo governo. As instituições do governo estão apresentando leis que querem garantir desmatamento, mineração e arrendamento das terras indígenas. Por exemplo, na Terra Indígena Sete de Setembro parte do governo estão apoiando a criação de uma cooperativa indígena de agronegócio, isso é muito ruim para os indígenas locais. A luta deles é de preservar a floresta, os rios, sua cultura e buscar uma forma econômica mais sustentável. Em seguida Virgílio Viana fundador da FAS (Fundação Amazonia Sustentável) que possibilitou esse encontro através do programa dos polos de inclusão digital, apresentou os principais desafios para a preservação da floresta amazônica e seus guardiões. A principal mensagem é de que já passamos da fase de conscientizar e agora é o momento de agir. Muito forte! Rosa dos Anjos, indígena, responsável na FAS pela área indígena apresentou falou dos desafios enfrentados pelos povos da Amazonia. Fomos (em torno de 15 países no evento) transportados virtualmente para a Aldeia Maronal onde o Cacique Alfredo Maronal nos deu noção dos desafios que estão vivenciando principalmente com os invasores nas fronteiras com o Peru e a Colômbia. São pescadores, caçadores, garimpeiros e narcotraficantes. Os representantes que vivem na cidade estão sendo ameaçados pelos pescadores e caçadores, recentemente teve troca de tiro na base do rio Ituí. Precisam de reforço nas bases e estrutura para evitar os invasores. Precisam que instituições e órgãos responsáveis para proteger as bases e seus representantes. O desmatamento já está ultrapassando para dentro das áreas indígenas no Acre. A preocupação dos indígenas como um todo é muito parecida. Esse encontro me emocionou muito! A chamada para o evento pode ser vista no https://bit.ly/AmazonPeople

Amanhã, 2 de junho, começa a Stockholm+50 que tem na sua programação oficial (ONU e Governo Sueco) apenas mais do mesmo. A reunião preparatória em 28 de março na sede da ONU (Nova York) selou o triste destino de um evento que tinha tudo para ser grandioso. Espero estar enganado. Enquanto isso nas ruas e nos eventos laterais, como o de hoje, há muita esperança de resultados importantes. A Stockhol+50 “de verdade” acontece fora dos muros oficiais. Estarei os próximos dias, como estive nos últimos dois, imerso nas dezenas de eventos paralelos. O Dia Mundial do Meio Ambiente é no próximo domingo, 5 de junho! Ironicamente o evento oficial termina no dia 3.

Que as próximas gerações nos perdoem………. perdoa-lhes, pois eles não sabem o que fazem!

Primeiro de Maio

Vaca não dá Leite

A história que se conta é que quando os filhos fizessem 12 anos o pai, contaria o Segredo da Vida. Esse segredo é que vaca não dá leite… você tem que tirar o leite da vaca e passar por todos os dissabores que essa operação exige. Apesar de ser uma boa analogia de que as “coisas” não caem do céu e de que é preciso trabalhar arduamente para consegui-las, ela também esconde um segredo maior ainda que, involuntariamente, acaba formando as crianças para um sistema que está ficando obsoleto (neoliberalismo). O segredo maior ainda é de que a vaca dá leite para o seu bezerro e não para nós, por isso, é necessário TIRAR o leite da vaca. A mesma analogia não funcionária tão bem, para as crianças, se o Segredo da Vida fosse que o boi não dá carne… é preciso tirar a carne do boi e passar pelos dissabores que essa operação exige. Uma parte significativa das novas gerações estão procurando ensinar o básico para os pais, professores, políticos e adultos em geral de que os animais dão leite para suas crias e não dão carne para nós. Apesar de todo blá blá blá dos que deveriam estar agindo como adultos, os jovens e as crianças não aceitam mais ouvir lições dos que continuam impunemente a TIRAR do seu futuro.

Estamos a um mês da Stockholm+50 que deveria ser o principal marco dos 50 anos de ações para a sustentabilidade e, no entanto, o fracasso já está anunciado pelo hackeamento desse evento pelo governo Sueco que ignorou completamente o esforço de anos de iniciativas da sociedade civil. É triste ver que no país de Greta Thunberg e Johan Rockström, a mais importante celebração das últimas décadas, será vergonhosa. Outras coisas ridículas antecederam esse evento. A ONU só ratificou oficialmente o evento em final de maio de 2021, a data original seria em maio, conseguiram que fosse transferido para 2 e 3 de junho enquanto a data dos 50 anos de Estocolmo 1972 é 5 de junho (que se tornou o dia mundial do meio ambiente). Dois dias antes, 31 de maio e 1 de junho, vai acontecer o Stockholm Learning Plaza da SoL (Society for Organizational Learning) que estou ajudando a organizar. Será um evento hibrido de conversas com os fundadores da SoL, Peter Senge e Göran Carstedt, com o Diretor de Objetivos do Desenvolvimento Interno Jan Henriksson, a vencedora do prêmio Rachel Carson, Marylin Mehlman, e muitos outros participantes engajados e conhecidos. Veja o programa do evento

E quanto aos povos indígenas? Está ocorrendo uma inacreditável violência com os povos originários. Na última 5ª feira (28/4), a ministra Cármen Lúcia cobrou uma apuração cuidadosa sobre o crime e a violência sofrida pelos Yanomami nas mãos dos garimpeiros. “Essa perversidade não pode permanecer como dados estatísticos, como fatos normais da vida. Não são. Nem podem permanecer como notícias”, disse a ministra. “Não é possível calar ou se omitir diante do descalabro de desumanidades criminosamente impostas às mulheres brasileiras, dentre as quais mais ainda as indígenas, que estão sendo mortas pela ferocidade desumana e incontida de alguns”. Leiam uma ótima matéria produzida pela Emily Costa e Elaíze Farias, da Amazônia Real

Veja os dados da importância das comunidades indígenas para a proteção das nossas florestas no MapBiomas que é a plataforma mais completa, atualizada e detalhada base de dados espaciais de uso da terra em um país disponível no mundo. Foi publicada no Dia do Índio em 19/04

Desmatamento… o Brasil foi responsável (irresponsável) por quase a metade do desmatamento das florestas primárias do mundo em 2021. Há, pelo menos, dez anos que o desmatamento está desgovernado pela gestão dos governos. Nos últimas três anos a destruição é sem precedentes! Na última 5ª feira (28/4),o Global Forest Watch publicou um relatório completo de 2021.

O consumidor, na maioria das vezes, é conivente com o desmatamento praticado, principalmente, pela indústria da carne. A informação foi revelada nesta última quarta-feira (27/04) pela plataforma Reclame Aqui. Ela faz parte de uma pesquisa realizada com quase 10 mil brasileiros entre 16 e 18 de novembro de 2021, que mostrou que quase 60% dos consumidores entrevistados (59,24%) não deixou de colocar no prato carne proveniente de marcas ligadas à destruição da floresta Amazônica. Chocante para dizer o mínimo! Ou seja, o crime ambiental é apoiado pelo governo e pelo consumidor. Muito triste, trabalhador do Brasil.

E quanto ao Dia Internacional do Trabalhador? Não se trabalha! A etimologia da palavra trabalho é bem curiosa, vem do latim Tripalium que significava um instrumento de tortura formado por três pedaços de madeira. A palavra foi passada para a língua francesa como Travail que tinha o sentido de sentir dor, sofrer. Essa forma passou para o Português (trabalho) e para o Espanhol (trabajo). No italiano Labor tinha o significado de Fadiga, Cansaço.  No alemão Arbeit sugere sofrimento, esforço e dificuldade e vem diretamente das palavras servidão, escravidão. O The Guardian escreveu um artigo interessante, em 2013, sobre as raízes da tortura no trabalho.

A origem do Dia do Trabalhador também é bem interessante e tem raízes no marxismo com a questão da redução das horas de trabalho por dia, 8 de trabalho, 8 de lazer e 8 para dormir. Apesar de mais de 80 países celebrarem esse dia em função de acontecimentos ocorridos em 1886 em Chicago nos EUA, a celebração americana ocorre na primeira segunda-feira de setembro.

Ofereço a quem estiver lendo esse texto uma flor de Muguet (lírio do vale), onde na França se presenteia, em 1º de maio, a família e amigos para se desejar alegria e boa sorte.

E finalmente, falando do Dia da Terra (22/04), com tantas notícias péssimas e a insistência em se continuar agindo e ensinando as crianças que podemos tirar da natureza sem uma alfabetização ecológica mínima que permita entender as consequências de nossos atos… uma boa notícia! Temos a Carta da Terra! Nosso principal documento enquanto responsabilidade humana em manter o nosso lar (a Terra) saudável para todos e principalmente para as futuras gerações. Honrando todos que participaram desse feito! Reproduzo aqui o preâmbulo desse precioso texto e convido a lê-la (espero que novamente) integralmente com atenção, escuta generosa e principalmente amor.

Carta da Terra – Preâmbulo

Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo se torna cada vez mais interdependente e frágil, o futuro reserva, ao mesmo tempo, grande perigo e grande esperança. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio de uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos nos juntar para gerar uma sociedade sustentável global fundada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura de paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade de vida e com as futuras gerações.

TERRA, NOSSO LAR

A humanidade é parte de um vasto universo em evolução. A Terra, nosso lar, é viva como uma comunidade de vida incomparável. As forças da natureza fazem da existência uma aventura exigente e incerta, mas a Terra providenciou as condições essenciais para a evolução da vida. A capacidade de recuperação da comunidade de vida e o bem-estar da humanidade dependem da preservação de uma biosfera saudável com todos seus sistemas ecológicos, uma rica variedade de plantas e animais, solos férteis, águas puras e ar limpo. O meio ambiente global com seus recursos finitos é uma preocupação comum de todos os povos. A proteção da vitalidade, diversidade e beleza da Terra é um dever sagrado.

A SITUAÇÃO GLOBAL

Os padrões dominantes de produção e consumo estão causando devastação ambiental, esgotamento dos recursos e uma massiva extinção de espécies. Comunidades estão sendo arruinadas. Os benefícios do desenvolvimento não estão sendo divididos equitativamente e a diferença entre ricos e pobres está aumentando. A injustiça, a pobreza, a ignorância e os conflitos violentos têm aumentado e são causas de grande sofrimento. O crescimento sem precedentes da população humana tem sobrecarregado os sistemas ecológico e social. As bases da segurança global estão ameaçadas. Essas tendências são perigosas, mas não inevitáveis.

DESAFIOS FUTUROS

A escolha é nossa: formar uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros ou arriscar a nossa destruição e a da diversidade da vida. São necessárias mudanças fundamentais em nossos valores, instituições e modos de vida. Devemos entender que, quando as necessidades básicas forem supridas, o desenvolvimento humano será primariamente voltado a ser mais e não a ter mais. Temos o conhecimento e a tecnologia necessários para abastecer a todos e reduzir nossos impactos no meio ambiente. O surgimento de uma sociedade civil global está criando novas oportunidades para construir um mundo democrático e humano. Nossos desafios ambientais, econômicos, políticos, sociais e espirituais estão interligados e juntos podemos forjar soluções inclusivas.

RESPONSABILIDADE UNIVERSAL

Para realizar estas aspirações, devemos decidir viver com um sentido de responsabilidade universal, identificando-nos com a comunidade terrestre como um todo, bem como com nossas comunidades locais. Somos, ao mesmo tempo, cidadãos de nações diferentes e de um mundo no qual as dimensões local e global estão ligadas. Cada um compartilha responsabilidade pelo presente e pelo futuro bem-estar da família humana e de todo o mundo dos seres vivos. O espírito de solidariedade humana e de parentesco com toda a vida é fortalecido quando vivemos com reverência o mistério da existência, com gratidão pelo dom da vida e com humildade em relação ao lugar que o ser humano ocupa na natureza.

Necessitamos com urgência de uma visão compartilhada de valores básicos para proporcionar um fundamento ético à comunidade mundial emergente. Portanto, juntos na esperança, afirmamos os seguintes princípios, interdependentes, visando a um modo de vida sustentável como padrão comum, através dos quais a conduta de todos os indivíduos, organizações, empresas, governos e instituições transnacionais será dirigida e avaliada.

Carta da Terra completa

Primeiro de Abril

Dia da Mentira, Verdade?

A verdade e a mentira se confundem de tal maneira que hoje está muito mais para uma escolha do que gostaríamos de acreditar do que uma busca pela verdade.

A fábrica de tornar as ficções criadas em verdadeiras funcionam de uma maneira até simples. A receita começa com uma porção generosa de verdade comprovada. Acrescenta-se, a gosto, mentiras deslavadas. Para tornar a ficção deliciosamente viral é necessário pitadas de criatividade com poder de alterar as emoções. O segredo está no cozimento onde se leva ao fogo muitas e muitas vezes e em diversas cozinhas dando a sensação de que o quitute é legitimo. Para completar a farsa, faça a história ser oferecida em muitos endereços, a maioria são cadeias próprias de restaurantes servindo comida requentada fingindo que existem. Os botequins são uma ótima opção para os paladares mais populares e viciados em pimenta. Não se preocupem com os formadores de opinião, eles virão, automaticamente, assim que a história começar a viralizar para parecer que foram eles que a viralizaram.

E a intenção de ter essa trabalheira toda? De gastar uma fortuna? Para que serve ficar sistematicamente enganando as pessoas? Coisa boa não deve ser!

Uma intenção pouco percebida é a de misturar uma receita repleta de mentiras deslavadas e absurdas que não tem qualquer intenção de se passarem por verdades. A ideia é causarem uma grande comoção e revolta para encobrir algo que não será percebido pelos militantes distraídos com a cortina de fumaça.  

A trama não para por aí. Existe também um número enorme de pessoas que se sujeitam a denegrir os que se manifestam contra a ficção do patrão por apenas alguns centavos. Fora os que são alvos permanentes das mentiras torneadas verdades.

As chamadas mídias tradicionais perderam a exclusividade em fornecer notícias manipuladas e nunca imaginaram que a total falta de pudor em mentir descaradamente substituiria uma notícia muito mais cuidadosa em sua confecção. Nasceu uma nova e importante modalidade do jornalismo que são os checadores de fatos (facts-checking). No Brasil temos, por exemplo, o ComProva , o Lupa e o Aos Fatos, entre outros. Já tem checadores de fatos fakes. Cuidado!

No campo do meio ambiente estamos bem servidos. Temos o SEEG, o Fakebook e o Mapbiomas. Os três são fornecedores de dados e informações muito precisos criados pelo Observatório do Clima e seus parceiros.

FAKEBOOK: https://fakebook.eco.br/

SEEG: http://seeg.eco.br/

MAPBIOMAS: https://mapbiomas.org/

A chamada era da “pós verdade” começou no Brasil em 2014, se fortaleceu nos EUA e no Reino Unido em 2016 e de lá para cá vivemos numa sociedade da desinformação.  

Incrível a capacidade do ser humano de acreditar no inacreditável!

Aliais, acreditar no que não existe foi, segundo Yuval Harari, o que nos fez chegar ao topo da cadeia alimentar e conquistar o planeta todo. Yuval diz que acreditar numa ficção foi o que possibilitou nós, homo sapiens, de nos agruparmos em números cada vez maiores, formando comunidades incomuns para as outras espécies de mamíferos. Vou postar novamente o vídeo dele no TEDx  nisso, é impressionante!  https://youtu.be/nzj7Wg4DAbs (escolha sua legenda).

Parece mentira, mas não é:

1- Deputado Estadual por São Paulo, o segundo mais votado em 2018, e pré-candidato ao governo do Estado de São Paulo, visita a Ucrânia e disse, em áudio vazado, (além de outras baixarias) que a “ucraniana é fácil porque é pobre”. Impossível ouvir o áudio sem achar que é fake. Ele mesmo admitiu que é verdade. A repercussão foi internacional. Espero que os quase 500.000 que votaram nele estejam morrendo de vergonha!

2- Presidente da República do Brasil recebe a medalha do mérito indigenista. Sim é verdade! Parece fake news ou piada de mal gosto. O ministro da justiça (também inacreditável) concedeu a honraria a aquele que mais vem contribuindo para a dizimação dos povos indígenas. Entre os 25 agraciados estão ministros como Braga Netto (Defesa), Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos) e Tereza Cristina (Agricultura). Parece que o critério para receber a medalha foi invertido. Também, para a vergonha de todos nós, com larga divulgação na mídia internacional.

3- Parece uma mentira grosseira, mas lamentavelmente é verdade! Ninguém, em sã consciência, faria uma coisa desses com o Brasil. Todos os retrocessos e ataques diretos, do governo, ao meio ambiente e aos povos originários são inacreditáveis. Entre os absurdos está o Saldão do Petrolão que está com pouca ou quase nenhuma visibilidade e vai ser decidido agora no dia 13 de abril. Divulgar! Divulgar! Divulgar! A estratégia é sempre aproveitar a miopia das mídias para PASSAR A BOIADA. Vão ofertar 1.068 blocos de exploração de petróleo e gas pelo Brasil todo. E dessa vez o truque sujo é a modalidade deixar de ser um leilão como anteriormente e se tornar Oferta Permanente. Ou seja quando aparecer um interessado será negociado. Recomendo a leitura do artigo da Mar sem Petróleo da Arayara e buscarem por mais informações ou demandar mais informações das mídias que você acompanha. É bem sério! Muito sério mesmo!

Mentira tem perna curta! Será?

Hoje já se sabe que o golpe militar de 1964 foi no dia 1 de abril e não no dia 31 de março como, durante anos, tentaram emplacar essa mentira. Muito irônico e simbólico. Os que ainda dizem que acreditam nessa mentira ou estão desinformados ou querendo desinformar.

Qual será a verdade sobre o golpe militar? Teria sido uma forma de evitar a invasão militar dos EUA que já estavam em águas territoriais brasileiras? Será que as forças armadas brasileiras, para evitar o pior, resolveram destituir o governo a força com a intenção de devolver logo que “arrumassem a casa”? Será que forças dentro do próprio exército conspiraram para reverter a intenção inicial e implantar uma ditadura? Será que para isso, além das torturas e deportações, conseguiram criar um personagem que fingia ser oposição ao regime, mas na verdade era um colaboracionista infiltrado? Teoria da conspiração? Ficção? Roteiro de um filme? O importante é perceber que a diferença entre a ficção e a realidade é apenas o que acreditamos. Como fazemos para acreditar numa coisa ou em outra? O documentário de 2020, “O Dilema das Redes” (The Social Dilemma), deixa muito claro como somos facilmente manipulados sem nos dar conta que nossas decisões estão sendo tomadas por influência dos (mal intencionados) algoritmos. Possivelmente mais de 90% dos eleitores foram e são propositadamente manipulados. Quanto % desses eleitores sabem disso? 1%? Se tanto! No primeiro turno das eleições presidenciais de 2018, conseguiram convencer um grande (grande mesmo) contingente de eleitores a abandonar o candidato que escolheriam para votar contra o que não queriam. Como foi possível manipular as pessoas dessa maneira? Como foi possível fazerem as pessoas acreditarem nessa ação completamente ineficaz? O resultado de uma manobra surreal como essa, é levar para o segundo turno os dois piores candidatos. Para piorar cria a ilusão de que os outros candidatos não eram representativos. Agora em 2022 vamos enfrentar o mesmo dilema das redes? Continuaremos a ser manipulados pela polarização dos algoritmos? Será que não aprendemos nada? Vamos continuar votando no segundo menos ruim acreditando que estamos evitando que o pior ganhe? O sentido democrático das eleições não era votar no candidato que melhor representa o que você acredita? Um percentual minúsculo acredita genuinamente em cada um dos considerados piores candidatos pela maioria. Um percentual um pouco maior se beneficia direta ou indiretamente de um desses piores e, portanto, acredita ser justo querer que ganhe para manter o benefício. Um percentual um pouco maior ainda, acredita em apostar seu voto num desses dois que estão na frente das pesquisas. Por isso acredito, que muitas vezes, as pesquisas são profecias autorrealizadas. Em 2014, no primeiro turno das eleições presidenciais, quem estava em segundo lugar nas pesquisas era a Marina Silva, com boas chances de vencer a Dilma no segundo turno. UM DIA antes da eleição as pesquisas DataFolha e Ibope (já falecida) apontaram Aécio Neves em segundo lugar. Ou seja, Marina Silva que estava em segundo lugar nas pesquisas desde a morte de Eduardo Campos em 13 de agosto até o dia anterior da eleição, perdeu uma significativa quantidade de votos com a migração de votos dos que não queriam o PT no governo e portanto votam em quem está em segundo lugar nas pesquisas. Mesmo com todas as Fake News e barbaridades orquestradas pelo confesso João Santana, não seria plausível acreditar que em dois dias tenha revertido as intenções de votos. E por mais incrível que pareça, um candidato à presidência contratou o marketeiro para a eleição desse ano. Teoria da conspiração? Ficção? Roteiro de documentário do Netflix? Relaxem… é 1º de abril!

As Fake News sempre existiram, mas a forma de levar as mentiras de forma criminosamente organizada para a manipulação da opinião pública começou no Brasil nas eleições de 2014. O governo da época, ao perceberem que perderiam as eleições, usaram de toda sorte de golpes e artimanhas para denegrir a imagem daquela que seria hoje presidente de um Brasil muito diferente. Em 2016 essa manipulação criminosa da opinião pública elegeu o improvável Donald Trump para a presidência dos EUA, sendo que a Hillary Clinton era folgadamente a favorita. Até envolvimento em tráfico de bebês, contrabando de crianças para pedófilos que governam os EUA conseguiram fazer muitas pessoas acreditarem que a Hillary estava envolvida. Uma pesquisa rápida vai encontrar dezenas de histórias sem nexo, principalmente as veiculadas pelo grupo QAnon. Ainda em 2016, o Brexit foi outro exemplo de como conseguir fazer o Reino Unido fazer o que não queria fazer… sair da União Europeia. Vale lembrar que os detalhes dessa manipulação foi amplamente divulgada com a ascensão e queda da Cambridge Analytica e a colaboração do Facebook e outras mídias sociais.

De 2014 para cá, as mentiras são o nosso dia a dia. Cada um acredita no que quer por mais absurdo que possa parecer para o outro. Vamos ter que criar outra forma de nos relacionar com o constante aumento da polarização entre o mal e o mal. A luta entre o bem e o mal ficou para trás? Será que não temos mais as nuances entre um polo e outro? As questões ligadas a gestão da pandemia só fez aumentar a distância entre “nós” e “eles”, entre o “certo” e o “errado”, entre a “ciência” e a “ciência”. Conforme o meu texto do mês passado, tudo que precisamos é de AMOR.

Essa semana, para mim, foi bem especial.

Na segunda-feira (28/03) foi a reunião preparatória da Stockholm+50 na sede da ONU (Nova York). Nenhuma novidade, continuei sentindo que teremos um evento inócuo. Tudo indica que o governo da Suécia hackeou o evento que vinha sendo organizado pela sociedade civil. Se realmente for isso, será triste ver o país que foi sede da primeira reunião de sustentabilidade, marco importante de tudo que temos hoje e de seus desdobramentos quanto a emergência climática. Os (apenas) dois dias do evento, 2 e 3 de junho, nem respeitam o 5 de junho data da Estocolmo 72 que se tornou o dia mundial do meio ambiente. Triste no país do Fridays for Future da Greta Thunberg e do Johan Rockström, referendado pelo David Attenborough no documentário Breaking Boundries.

Nos dois dias anteriores a Stockholm+50, a SoL (Society for Organizational Learning) estará realizando um evento (Stockholm Learning Plaza) que estou ajudando a organizar. Teremos no primeiro dia uma série de conversas generativas, entre elas um diálogo entre Peter Senge (criador da SoL) e Jan Artem Henriksson, diretor do Inner Development Goals (Objetivos do Desenvolvimento Interior).

Os Objetivos de Desenvolvimento Interior (IDGs) são um modelo das capacidades, qualidades e habilidades que precisamos para alcançar os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Eles querem educar, inspirar e capacitar as pessoas para serem uma força positiva de mudança na sociedade e encontrar uma maneira mais intencional de olhar para nossas vidas e as vidas das pessoas ao nosso redor. São uma iniciativa global que desenvolve habilidades internas, habilidades e outras qualidades para pessoas e organizações envolvidas em esforços para contribuir para uma sociedade global mais sustentável.

O segundo dia será de visitas técnicas em projetos que estão fazendo a diferença no movimento ambiental. O evento terá a possibilidade de escolher entre o presencial e o virtual. Informações detalhadas e inscrições podem ser feitas no site.  https://sol-learning-plaza-2022-onsite.confetti.events/

Que bom ver a parte do Brasil que funciona

Ontem retornei de um evento, de três dias (29,30 e 31/03), com 150 ambientalistas de 53 entidades das 72 entidades membros do Observatório do Clima (oc.eco.com.br). Foi o mais generativo encontro em que já estive. Aprendizagem nas trocas de saberes e conhecimento. Foi uma esperança (esperançar) de que podemos contar um com os outros, de que não estamos sozinhos, apesar de nossas diferenças. Não sei se já aconteceu algo semelhante no Brasil. O Observatório do Clima celebrou 20 anos de existência e de persistência. Estávamos em peso cuidando do futuro aqui e agora. Cuidando dos cuidadores e dos criadores. Falando com a alma, trabalhando com o ser integral. Integrando! Esse encontro foi histórico e será lembrado por décadas.   

Para coroar a semana, hoje de manhã, no encontro mensal da SoL Brasil (Society for Organizational Learning) recebemos a Marcia fundadora do INSTITUTO RAIAR e idealizadora do PACTO PELA ALFABETIZAÇÃO. É uma emoção escutar a trajetória dela nesse projeto tanto no âmbito pessoal como institucional. O amor pelas crianças e profundo conhecimento que adquiriu para diagnosticar a causa e agir diretamente nela foi animador. Ela se baseou numa experiência exitosa da cidade de Sobral e a ampliou. Ela trabalha em parceria com as redes municipais de educação e tem como principal objetivo a implantação colaborativa de uma política pública de alfabetização para melhorar os indicadores de alfabetização, aumentando as chances de cada criança avançar em sua trajetória escolar. Foi lindo! Espero que tenhamos a oportunidade de conhecer em profundidade esse projeto de amor pelas crianças. Me lembrei muito da Peo (Maria Amelia Pereira) da Casa Redonda que, para mim, é o melhor exemplo de educadora no Brasil. Ela se foi no início de novembro passado.  

Primeiro de abril é, também, o dia mundial do Psicodrama. O seu criador, J.L. Moreno, foi uma pessoa extraordinária e muitas das suas visionárias criações deram frutos e estão hoje no nosso dia a dia sem que saibamos que ele tenha sido o pai. Ele é, por exemplo, pai das redes sociais. Isso mesmo! O Facebook, Instagram, Tik Tok, WhatsApp devem suas origens a ele. Foi o primeiro a desenvolver as ideias de redes socionomicas. Tudo que veio depois partiu de seus modelos.

O Psicodrama, como ele dizia, será a principal terapia do século 21. Isso já está acontecendo de forma acelerada. Entre as diversas modalidades, uma delas, o Psicodrama Virtual está se tornando cada vez mais utilizado. A pandemia acelerou sua necessidade e apesar de ainda estar no estado da arte, está se aprimorando cada vez mais.

Conhecer o Psicodrama é fundamental para qualquer pessoa trabalhando com saúde. Ele vem sendo cada vez mais recomendado para inúmeras questões. Acredito que realmente será “a” terapia deste século.

No início de setembro desse ano será realizado o Congresso Brasileiro de Psicodrama, liderado pela talentosa Maria Célia Malaquias. Será uma oportunidade para aqueles que ainda não estão familiarizados conhecerem melhor essa poderosa terapia. Estou tendo o privilégio de estar ajudando na organização e de apresentar, com a Érica Magacho, uma aula sobre o Psicodrama Virtual. Vejam mais informações e inscrevam-se no psicodrama.com.br

Agência Pública

Quero recomendar uma ótima entrevista da Agência Pública, publicada hoje, para conhecer algumas das ideias e ideais da Marina Silva. Ela está avaliando se vai aceitar ser candidata a Deputada Federal. Ela diz: “derrotá-lo (o presidente) é um ato de legítima defesa da civilização, da democracia, dos indígenas, da educação, de tudo que é constitutivo de avanços da dignidade humana.”

E a pandemia? Acabou?

Não!

Vou deixar para o próximo mês falar das idas e vindas, das verdades e das MENTIRAS que ninguém realmente sabe o que está acontecendo. Esse texto todo se reflete fortemente no desempenho da gestão desse tema desde o início de 2020.

Primeiro de Março

Tudo que precisamos é… Amor!

Hoje, 1º de março, é o Dia Mundial do Futuro. Que futuro é esse? Se o futuro é o resultado das ações do presente… que presente é esse?

Aparentemente a humanidade está conspirando para a extinção ou drástica redução de si mesma. E o pior é que nos consideramos animais racionais e inteligentes. Seriam as ações cometidas contra nós mesmos apenas uma forma da natureza reagir a uma espécie invasiva (praga)? Prefiro não acreditar nisso. Prefiro acreditar que temos centenas de milhares de boas sementes germinando nas novas gerações e que vão florescer para alterar o rumo ditado atualmente pela grande minoria de déspotas, seus fiéis seguidores e uma enorme maioria de colaboradores através do silêncio ou das ações de banalidade do mal.

A Rússia está atacando a Ucrânia desde o dia 24 (23 no Brasil) de fevereiro e o Putin declarou nesse mesmo dia que quem tentar impedir ou criar ameaças para o país ou seu povo, “a Rússia responderá imediatamente e levará a consequências nunca enfrentadas em toda sua história”. No último domingo (27/02) Putin acabou com a aparente tranquilidade de qualquer ocidental que acreditasse estar a uma distância segura do campo de batalha. Ele ordenou que as forças nucleares russas mudassem para um estado de alerta mais alto que ele chamou de “prontidão de combate especial”.

De todo o noticiário, o texto do Yuval Harari de ontem (28/02) no “The Guardian”, foi o que mais gostei. O título já diz tudo: “Por que Vladmir Putin já perdeu essa guerra.”

Separei alguns trechos:

“Com menos de uma semana de guerra, parece cada vez mais provável que Vladimir Putin esteja caminhando para uma derrota histórica. Ele pode ganhar todas as batalhas, mas ainda assim perder a guerra. O sonho de Putin de reconstruir o império russo sempre se baseou na mentira de que a Ucrânia não é uma nação real, que os ucranianos não são um povo real e que os habitantes de Kiev, Kharkiv e Lviv anseiam pelo governo de Moscou. Isso é uma mentira completa – a Ucrânia é uma nação com mais de mil anos de história, e Kiev já era uma grande metrópole quando Moscou nem era ainda uma vila. Mas o déspota russo contou sua mentira tantas vezes que aparentemente ele mesmo acredita nela.”

“A cada dia que passa, fica mais claro que a aposta de Putin está falhando. O povo ucraniano está resistindo de todo coração, conquistando a admiração do mundo inteiro – e vencendo a guerra. Muitos dias sombrios estão por vir. Os russos ainda podem conquistar toda a Ucrânia. Mas para vencer a guerra, os russos teriam que controlar a Ucrânia, e eles só podem fazer isso se o povo ucraniano permitir. Isso parece cada vez mais improvável de acontecer.”

“Ao derramar cada vez mais sangue ucraniano, Putin garante que seu sonho nunca será realizado. Não será o nome de Mikhail Gorbachev escrito na certidão de óbito do império russo: será o de Putin. Gorbachev deixou russos e ucranianos se sentindo como irmãos; Putin os transformou em inimigos e garantiu que a nação ucraniana daqui em diante se posicione em oposição à Rússia.”

“O déspota russo deveria saber disso (nações são construídas por histórias) tão bem quanto qualquer um. Quando criança, ele cresceu alimentado por histórias sobre as atrocidades alemãs e a bravura russa no cerco de Leningrado. Ele agora está produzindo histórias semelhantes, mas se colocando no papel de Hitler.”

Texto publicado no The Guardian

Harari vem, há alguns anos, nos alertando para os três principais perigos para o futuro da nossa humanidade que exigiriam uma cooperação global: guerra nuclear, colapso ecológico e disrupção tecnológica. Estamos, no momento, vivenciando intensamente esses três perigos.

Nessa constante guerra de polarização – somos sempre nós contra eles – Quem somos nós? Rússia contra o resto do mundo menos China, Índia, Brasil, África do Sul (BRICS?) e alguns outros mais tímidos. Portanto estamos do lado da Rússia, correto? Estamos do lado da Rússia da mesma maneira que os russos estão do lado do Putin. Novamente… quem somos nós e quem são eles? De alguma forma Putin está conseguindo realizar um fato inédito: unir todo o mundo para o lado do “nós” independentemente de seu país de origem, crença religiosa, ser a favor ou contra as vacinas de covid19, time que torce, partido político e até mesmo se está ou não no metaverso.

Além do Dia Mundial do Futuro, hoje é Carnaval a festa mais popular do Brasil. Uma festa de origem bem antiga que foi cristianizada em que se prepara para a entrada da Quaresma onde o jejum de carne é (ou deveria ser) obedecida por 40 dias. O “carnem vale” (adeus a carne) é uma festividade onde os excessos são, de alguma forma, permitidos. Talvez estejamos vivendo um momento de “carnem vale” da humanidade e espero que os excessos estejam chegando ao fim para e que nós possamos sobreviver a esse carnaval.

Nesses últimos dias de insanidade dentro das fronteiras da Ucrânia, uma foto romântica de um casal, a russa Juliana Kuznetsova e seu noivo ucraniano cobertos com suas respectivas bandeiras, viralizou nas mídias sociais. Apesar de bem significativa para esse momento, a foto não foi tirada durante os conflitos dessa semana como se acreditou. Na verdade, ela foi tirada durante um concerto de música em Varsóvia, na Polonia em 2019.

Imagens com gestos de amor em momentos de conflito são manifestações de rara beleza. A foto (acima) desse texto foi tirada pelo fotógrafo Rich Lam, durante uma manifestação nas ruas de Vancouver em 2011. A foto é perfeita: emoldurada por um policial desfocado em primeiro plano e a fumaça com a multidão ao fundo, ali, no meio de um tumulto, um casal se beijando no meio de uma rua de Vancouver, praticamente brilhando na iluminação das luzes da rua. Chegou-se a pensar que a foto foi posada de tão bela que é. Um vídeo feito por um morador de um prédio em frente mostra (de cima) quando policiais derrubam e agridem com violência o casal. O rapaz, Scott Jones, relatou que depois que foram agredidos beijou Alex Thomas para acalmá-la. O casal de namorados, Scott (australiano) e Alex (canadense) se casaram e hoje moram na Austrália. Quando vemos uma imagem dessas, temos certeza de que tudo que precisamos é… Amor!   

All We Need is Love”, uma das mais significativas músicas compostas por John Lennon. Ela foi encomendada em junho de 1967 pela BBC de Londres para fazer parte de uma transmissão, pela primeira vez, ao vivo. Esse ambicioso programa foi chamado de “Our World” (Nosso Mundo), o primeiro programa de televisão global do mundo, que propunha ligar 25 países em cinco continentes simultaneamente por satélites que orbitam a Terra. Teve um alcance de mais de 400 milhões de espectadores, tornando este o programa de televisão mais ambicioso e histórico de seu tempo. John criou uma música com uma mensagem simples de entender mesmo para o quem não falasse inglês. Uma mensagem de amor para um mundo global unido ao vivo. O evento teve participação de convidados como Mick Jagger, Marianne Faithfull, Keith Richards, Keith Moon e Graham Nash. All You Need is Love é até hoje um hino que resume tudo que precisamos: Amor!  

Poucos anos depois John Lennon nos deixa outra mensagem:

“Imagine não haver o paraíso

É fácil se você tentar

Nenhum Inferno abaixo de nós

Acima de nós, só o céu

Imagine todas as pessoas

Vivendo o presente

Imagine que não houvesse nenhum país

Não é difícil imaginar

Nenhum motivo para matar ou morrer

E nem religião, também

Imagine todas as pessoas

Vivendo a vida em paz

Você pode dizer que eu sou um sonhador

Mas eu não sou o único

Espero que um dia você junte-se a nós

E o mundo será como um só

Imagine que não ha posses

Eu me pergunto se você pode

Sem a necessidade de ganância ou fome

Uma irmandade dos homens

Imagine todas as pessoas

Partilhando todo o mundo

Você pode dizer que eu sou um sonhador

Mas eu não sou o único

Espero que um dia você junte-se a nós

E o mundo viverá como um só”

Primeiro de Fevereiro

Fim da Pandemia?

A Dinamarca decretou, a partir de hoje, o fim da pandemia. É o primeiro país da Europa a fazer isso. Apesar dos casos ainda estarem altos e da subvariante BA.2 da Ômicron (mais contagiosa) ser a dominante no país. A primeira-ministra Mette Frederiksen anunciou que o país pretende regressar à vida antes do coronavírus e que a doença já não será mais considerada uma ameaça à sociedade. Eles estão se baseando na constante baixa da necessidade de leitos de UTI e não no aumento da contaminação. 

O que significa isso? Luz no fim do túnel? Parece até estranho pensarmos, por exemplo, que as máscaras não serão mais utilizadas no transporte público. O gesto da Dinamarca abre um caminho para os outros países se posicionarem em relação as restrições e as medidas sanitárias. A Espanha está indo na direção de se declarar numa endemia ao invés de pandemia. O Reino Unido também tem feitos esforços nessa direção. Será o começo do fim da pandemia?    

No Brasil, apesar do apagão dos números, das dificuldades com testagem e subnotificações nunca estivemos num patamar tão alto de contaminação. Hoje os números divulgados foram de 193.465 casos e 929 óbitos confirmados. A média móvel diária (últimos 7 dias) de hoje é de 186.985 casos e 609 óbitos. Lembrando que os números dizem muito pouco da realidade e que não deveriam ser comparáveis entre os países. Para aqueles que querem olhar mais de perto essa numerologia e não ficarem com a oferta repetitiva das mídias consulte o Worldometer e faça suas interações.  Outro site que recomendo é o Mapping Covid-19 da John Hopkins

Agora algumas questões importantes que não têm uma resposta única. A variante Ômicron é menos perigosa? Se sim, o quanto é menos perigosa? As vacinas permitem algum tipo de proteção? Se sim, existem proteções diferentes entre as 10 vacinas aprovadas em uso? Alguma das 170 vacinas candidatas em desenvolvimento clínico estão (ou vão) incorporar a nova variante, hoje dominante? O que deve ser feito quando alguém contrair o COVID-19?

Parece que esse ano, no Brasil, além da pandemia teremos o pandemônio das eleições. Alguns comportamentos são similares. As pessoas tendem a acreditar nos números e tomarem decisões baseadas neles. O “quem disse” é sempre mais importante do que “o que é dito”. A ciência é sempre mencionada como a prova de que o argumento está correto. As mentiras sobre si mesmo e os outros são divulgadas por especialistas regiamente pagos. Questionar qualquer coisa do processo o coloca automaticamente como negacionista, não importa o lado ou o conteúdo da questão.   

Acreditar no inacreditável é a nossa maior qualidade e, ao mesmo tempo, nosso maior defeito. Albert Einstein já nos dizia de que a imaginação é mais importante que o conhecimento. A percepção cria nossa realidade e nos faz pensar e agir como se estivéssemos todos na mesma realidade. Dizemos que aqueles que pensam e agem de forma diferente estão fora da realidade. Temos uma resistência em sentir que existem outras realidades além da nossa. Para os que acreditam que a Terra é plana, é chocante perceber que uma grande maioria das pessoas não veem o óbvio. Por outro lado, é inconcebível para os que acreditam que a Terra é redonda que exista um grupo que pense diferente. Os dois lados alegam que os outros negam evidências cientificas. Acreditamos porque todos acreditam, todos acreditam porque todos acreditam e por isso, inacreditavelmente, funciona. Vivemos numa realidade virtual criada pela imaginação daqueles que estão em posição cria-las e seguimos andando fingindo que estamos plenamente conscientes da realidade. O que faz a gente acreditar no inacreditável? A fala mais inspiradora para mim, foi proferida pelo Yuval Harari em junho de 2015. Esse vídeo (https://youtu.be/nzj7Wg4DAbs)  deveria ser visto e revisto muitas e muitas vezes para que a gente nunca se esqueça de lembrar. Assista! Se já assistiu, assista novamente! Ele diz que a cooperação existe por causa da imaginação. Acreditamos coletivamente em ficções e seguimos as regras culturais dessas histórias que nós mesmos inventamos. Usamos linguagem para criar realidades mais do que para descrever a realidade objetiva.

Quais são os mecanismos que fazem com que a gente continue vivendo e contribuindo para que todas essas ficções permaneçam? É insano, para dizer o mínimo, acreditarmos que mantendo as coisas como estão obteremos resultados diferentes. Einstein já nos dizia isso.

Vamos para as eleições desse ano. Mudou alguma coisa nas últimas décadas? Se não, como podemos esperar que alguma mudança ocorra? As pessoas tendem a acreditar que tudo bem terem cometido um erro com o seu voto, porque na próxima eleição mudam isso. Ou acreditam que a culpa desse resultado é do outro…  daquele que o voto elegeu esse candidato, não percebem que foi seu candidato que permitiu que esse foi eleito. Confuso? Pois é, bem confuso mesmo. O sistema eleitoral brasileiro continua a funcionar do mesmo jeito a despeito dos partidos mudarem de nome ou das empresas de pesquisa, também, mudarem de nome. Nada mudou! Nada muda! Desde quando essa ficção existe? Há 2.500 anos atrás já existia e o filósofo grego Sócrates, segundo Platão, já alertava que o sistema de votação em que cada voto vale a mesma coisa nunca funcionaria. Seria preciso capacitar os eleitores para que tivessem habilidade de escolher e aí sim a votação poderia trazer bons resultados. Ele dá como exemplo o navio dos tolos em que os marinheiros acreditam serem capazes de navegar, mas não se entendem e escolhem os mais populares e menos capacitados para capitanearem o navio. O resultado é esse que vemos no mundo todo, com raras exceções. Tanto a gestão da pandemia, como a da governança política é uma ficção que somos obrigados a engolir e a participar.   

Todos esses comportamentos humanos já foram amplamente estudados e classificados e diversos experimentos nos ajudam a entender porque somos como somos.

Conformismo – Escolhemos nos comportar como o grupo de comporta. Mesmo que individualmente escolheríamos outro caminho preferimos o conforto de seguir o bando. Salomon Asch conduziu vários experimentos comprovando que as pessoas preferiam ignorar a realidade e darem respostas incorretas para ficarem em conformidade com o grupo. Muitos reportaram que apesar de saberem que as respostas estavam erradas não queriam se sentir ridículos diante do grupo. Outros simplesmente não confiaram em suas próprias opiniões e acreditaram que as respostas do grupo estavam corretas.

Dissonância Cognitiva – Já mencionei isso em outros textos anteriores. O nosso cérebro é desenhado para amenizar e ou anular as percepções quando nossas crenças e valores são confrontados pela realidade. Acreditamos firmemente em alguma coisa, como por exemplo, o carro do vizinho é verde. Quando nos deparamos com o carro azul do vizinho ocorre uma desagradável dissonância cognitiva e nosso cérebro encontra desculpas plausíveis ou não para que o nosso engano seja mitigado ou anulado. Por exemplo, podemos nos dizer que era verde e que foi pintado ou trocado. Podemos apenas amenizar dizendo que estava escuro quando registramos que era verde. Podemos, também, reduzir a importância desse fato para amenizar a dissonância.    

Efeito espectador – ou apatia do espectador, é uma teoria da psicológica social que afirma que os indivíduos são menos propensos a oferecer ajuda a uma vítima quando há outras pessoas presentes. Quando estamos falando de fake news e seus sistemas de funcionamento, as pessoas ficam imobilizadas para se contraporem a uma mentira ou injustiça que o fariam imediatamente numa situação individual. Além disso os produtores desses crimes sabem que se colocarem comentários negativos à vitima logo após a publicação haverá uma propensão maior a não contradizerem esses primeiros comentários e atrairá pessoas para incitar o ódio já proferido.

Banalidade do Mal – Conceito originalmente criado por Hannah Arendt em que as pessoas fazem o que fazem sem se darem conta que estão sendo cumplices do resultado de sua colaboração. Esse é talvez um dos maiores problemas dessa crise civilizatória que estamos vivendo. Todos nós, em maior ou menor grau, estamos sendo coniventes de alguma forma com algumas das barbaridades que estão acontecendo em detrimento de nossa humanidade. Stanley Milgram, na década de 1960, realizou uma serie de experimentos controversos sobre os conceitos de obediência e autoridade. Até onde as pessoas iriam obedecendo ordens superiores?  Muito influenciado pelas conclusões de Hannah Arendt no julgamento do nazista Eichmann, o psicólogo de Yale produziu um estudo que ficou conhecido como o Experimento de Milgram. Seus experimentos envolviam instruir os participantes do estudo a aplicar choques de alta voltagem a um ator em outra sala, que gritaria e eventualmente ficaria em silêncio à medida que os choques se tornassem mais fortes. Os choques não eram reais, mas os participantes do estudo foram levados a acreditar que eram. Milhões de pessoas que trabalham hoje em organizações que estão claramente ligados a corrupção, fraudes religiosas, danificação socioambiental, insegurança alimentar, desflorestamento, degradação dos recursos hídricos, poluição e tantos outros crimes contra a humanidade, não se sentem causadoras ou cúmplices do estrago que sua colaboração está causando. Sem querer julgar ninguém pelos motivos que os levam a fazer isso, estão sendo coniventes com os resultados. Um livro lançado agora em janeiro, está causando muitas controvérsias. Trata-se do “The Betrayal of Anne Frank” da autora canadense Rosemary Sullivan baseado em seis anos de pesquisa para descobrir quem denunciou aos nazistas o esconderijo da família da menina Anne Frank. As conclusões levaram a indicarem como suspeito, Arnold Van den Bergh que era do conselho judaico em Amsterdã. Essa história apareceu no popular programa americano do 60 minutes. Talvez a gente entre numa era onde a transparência fique cada vez mais emergente e as pessoas comecem a pensar melhor no que estão fazendo e quais as consequências desses seus atos.            

Preconceito – O tema é mais amplo e entra no campo da diversidade e todas as suas ramificações. Gostaria apenas de trazer o trabalho da Jane Elliott ensinando as crianças e adultos sobre como se sentem ao serem descriminadas. É muito lindo! Ela começou a fazer isso logo após o assassinato de Martin Luther King onde seus alunos já o tinham escolhido para fazerem um trabalho sobre ele. Ela declara que não podia simplesmente passar a informação que estava rolando na mídia. Sua iniciativa virou um episódio (1985) na TV pública (Frontline – PBS) e depois um documentário imperdível em 1996, Blue Eyed (Olhos Azuis). Segue um link sem boa resolução que encontrei. Tem até um presente, do GNT, que é a fala inicial do Eduardo Giannetti. Acredito que esteja no arquivo do Globo Play em boa resolução.    https://youtu.be/In55v3NWHv4

Estou sugerindo um site (em inglês) com uma coleção de experimentos que valem a pena serem vistos e os que mais gostarem pesquisem na internet.  

Entre outras de janeiro: O cantor Neil Young, fez um pedido para o Spotify tirar do ar um podcast que ele alegava estar passando informações errôneas sobre a pandemia. Young finalmente disse que não ficaria no Spotify se o podcast de Joe Rogan não fosse banido. O Spotify retirou todas as músicas de Neil Young da plataforma. Outros cantores estão começando a aderir ao boicote. Já aderiram Graham Nash, India Arie, Joni Mitchel, James Blunt e outros. Além disso o Spotify já tinha recebido uma carta assinada por médicos e outros profissionais da área médica com o mesmo pedido. O Spotify paga uma alta quantia para o controverso Joe Rogan ficar exclusivo dessa plataforma. Quais serão os próximos capítulos dessa colisão, dessa coalisão?

Por fim gostaria de complementar uma frase do texto do mês passado onde falei do filme Don’t Look Up (Não Olhe para Cima): É preciso olhar para cima… para baixo, para os lados, para frente e para trás

É preciso olhar para cima… para baixo, para os lados, para frente, para trás e principalmente para DENTRO.

Primeiro de Janeiro

Bom dia 2022!

Como você será? Será mais generoso do que o ano anterior? Será que ainda dá tempo de fazer alguns pedidos?

Por favor não nos deixe voltar ao anormal e nem a um novo anormal. Não nos deixe repetir as obscenidades e atrocidades das eleições de 2018, para que as pessoas possam votar a favor de seus melhores e não contra os seus piores. Não permita que as florestas, as águas, a terra e a atmosfera sejam aniquiladas como vem sendo nos últimos dez anos, principalmente nos últimos três. Proteja os povos indígenas com suas mais de 300 etnias em que suas sabedorias planetárias estão se fazendo tão necessárias. Cuide muito bem dos artistas e de suas manifestações. Que a cultura seja percebida como gênero de primeira necessidade. Que a educação aproveite o tsunami da pandemia e migre do século 19 para o 21. Chega de fingir que se ensina e que se aprende. Que não se use em vão o nome da ciência para justificar qualquer argumento. Que a medicina possa cuidar mais da saúde do que da doença. Que a fé venha pela espiritualidade. Que a religião perceba que somos todos um. Que o COVID e suas variantes sejam mais gentis e nos una ao invés de nos dividir. Que a diversidade seja vista e reconhecida como uma grande vantagem sociocultural. Que a economia e os economistas percebam, finalmente, que são gestores da ecologia. Que uma governança eticamente responsável prevaleça. Que a Estocolmo+50 tenha resultados significativos!

Será que é pedir muito? Se for, sei que não estou sozinho!

Estamos na era das incertezas… isso é certeza! Edgar Morin que o diga!

O que aconteceu em dezembro de 2021?

CUIDADO: Não olhe para cima!

No dia 24 de dezembro o Netflix lançou o filme “Don’t Look Up” (Não olhe para cima). Procurei desligar todos os meus preconceitos que me fariam não ver o filme. Preciso confessar que gostei do resultado. É uma caricatura com todo tipo de humor, vai do pastelão ao escrachado, do politicamente muito incorreto ao sutilmente ácido. É uma sátira do que está acontecendo hoje em relação a emergência climática. Ele conversa e se relaciona com o público em geral que não tem muita noção do que está acontecendo ao seu redor com relação ao governo, as mídias, as empresas e provavelmente não imagina que os caricaturados são o próprio público que está vendo o filme. O fato do roteiro ter sido escrito antes da pandemia dá um tom quase profético à cadeia de eventos que relacionam a insignificância dos chefes de estado em relação a um problema de grande magnitude civilizatória e sua subserviência ao capital privado.

A ideia é simples, um cometa está vindo em direção ao nosso planeta e, em pouco tempo, vai se chocar causando nossa extinção. Genial! Até hoje, as evidências de que estamos rumando à extinção não deram certo porque preferimos acreditar no inacreditável. Acreditamos coletivamente em coisas que não existem e somos chamados a colaborar com essa ficção. Estamos tão envolvidos nela que a chamamos de realidade. No entanto, vira e mexe, aparecem verdades inconvenientes que nos levam a preferir aceitar mentiras convenientes para continuarmos no jogo. Quando Al Gore, lançou o documentário “Uma Verdade Inconveniente” em 2006 acreditei que agora o mundo não refutaria as evidências tão claras das mudanças climáticas e de que seria impossível ignorá-las. Mesmo com todas as tentativas de desbancá-lo, quando ganhou o Prêmio Nobel da Paz, em 2007, junto com o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) fiquei aliviado de que agora o mundo todo se conscientizaria e começaria a agir nessa direção. Lembrando que esse conhecimento não era novo, vinha desde 1972 (Estocolmo) e fortemente confirmado em na Rio 92. Me senti como o personagem do Leonardo DiCaprio, sem ser um cientista, chocado que o mundo escolhia não ver! Completamente abismado com tudo em volta que mantinha a farsa. Essa sensação continuou a me ocorrer muitas vezes depois disso. Em 2010 no primeiro Fórum Mundial de Sustentabilidade em Manaus, em 2012 na Rio+20, em 2015 na COP21 em Paris, em 2018 no Fórum Mundial da Água em Brasília, em 2019 na Cúpula do Clima da ONU em Nova York e virtualmente na COP26 em Glascow.    

Quais são as verdades inconvenientes que não podem aparecer?   

Fiz uma lista rápida de algumas que me ocorreram. Claro que tem as mais óbvias que são criadas, quase que diariamente, pelo atual governo federal. Mas vamos a minha listinha: origens da soja transgênica no Brasil; liberação sistemática dos agrotóxicos; COP26 e a Ômicron pelo mundo; usina de Belo Monte; indústria da proteína animal; agricultura predatória; Código Florestal; indústria da pesca; escândalo da FIFA; escândalo da Petrobras; pedofilia na igreja e muito mais verdades inconvenientes que precisam de lastro nas mentiras convenientes (Fake News) para manterem a realidade da ficção.        

Nem o diretor do filme, Andy McKay, olhou para cima!

Numa conversa entre o diretor e boa parte do elenco após o lançamento do filme, Andy McKay (diretor) pergunta, no final, o que cada um faria nos últimos momentos do mundo. Assim que Leonardo DiCaprio diz que faria exatamente como está no filme, Andy diz que comeria um sanduíche gigante de carne (Philly Cheese Steake), na contramão do que o filme está procurando denunciar… ou seja ele também faz parte da indústria que se alimenta da ignorância alheia através da sua própria. Irônico, para dizer o mínimo! A indústria da proteína animal é, talvez, uma das mais sensíveis verdades inconvenientes… mesmo entre os ambientalistas.  

 Conversa (em inglês): “Don’t Look Up” Cast Breaks Down Their New Netflix Comedy | Around the Table | Entertainment Weekly

E mais de dezembro:

Gabriel Boric foi eleito presidente do Chile. Terá 36 anos quando assumir em março. O que significa isso? Possível prever alguma coisa? Torcendo para que seja uma ótima oportunidade para uma real guinada na maneira de se fazer política. O mundo está de olho nos próximos passos do Chile e torce para que os resultados sejam bons. Porém, estamos na era das incertezas!  

Uma notícia que me deixou muito triste foi o fechamento da edição do El País Brasil, do qual assinava. A qualidade jornalística e independente com a brilhante liderança da jornalista Carla Jimenez e com colunistas de muita qualidade como a Eliane Brum, vai fazer falta… muita falta!

As enchentes na Bahia foram as piores dos últimos 30 anos e 153 municípios já decretaram situação de emergência (climática?). O governo Federal parece não estar olhando para essa tragédia como deveria, além disso recusou a ajuda humanitária externa oferecida pela Argentina.

Antes de tudo isso a Agência Pública fez uma ótima reportagem mostrando os privilégios com a água do Cerrado baiano.

 A situação na Amazonia só piora, principalmente pelo desmonte dos sistemas de fiscalização e liberação explícita para o extrativismo ilegal dos recursos naturais. Uma reportagem da Hellen Guimarães para a Revista Piauí mostra os crimes em série na Amazônia.    

Apesar das promessas durante a COP26, os varejistas globais continuam comprando carne ligada ao desmatamento. Uma investigação da Repórter Brasil mostra os elos que conectam a pecuária ligada ao desmatamento na Amazônia, no Cerrado e no Pantanal com supermercados na Europa e Estados Unidos.

Alerta Ômicron – Olhem para cima! Estamos vivendo um momento surreal no Brasil. Enquanto a maioria da população brasileira acredita que o COVID está dando uma trégua por aqui e até mesmo comemorando o fim da pandemia, os números de infecções tem aumentado numa proporção nunca vista antes. Como os sistemas de informações estão completamente instáveis o principal indicador é o pessoal. Você nunca viu tantas pessoas próximas testando positivo. Além disso seria completamente sem noção acreditar que a Europa e os EUA estão tendo um aumento gigantesco de casos, nas últimas duas semanas, e que isso não vai se refletir no Brasil. Ainda não sabemos se a nova variante será uma redução dos casos graves ou se continuará a afetar mais gravemente uma percentagem ainda significativa da população. A pandemia ainda não acabou!  

É preciso olhar para cima… para baixo, para os lados, para frente e para trás

O meu livro do ano de 2021 é o “Lições de um Século de Vida” do Edgar Morin.

O filme de 2021 é o documentário “Rompendo Barreiras” com David Attenborough.

Até o mês que vem! Tenho a sensação de que será um daqueles meses que parecem um ano!

Há exatamente dois anos eu iniciava essa série de cartas escritas no primeiro dia de cada mês. A ideia é que seria um capítulo reportando o dia a dia de cada mês. O desafio que me coloquei era de começar e terminar o texto no dia 1 de cada mês, independentemente de como seria meu dia. Seriam minhas impressões expressas espontaneamente, sem qualquer elaboração prévia ou posterior. A primeira carta foi escrita no primeiro dia do último ano da segunda década do século 21 (01/01/2020) e estamos hoje no primeiro dia do segundo ano da terceira década, mergulhados de corpo, mente e alma no tema principal do livro: Percepção!

Primeiro de Dezembro

Da COP26 à presença do Ômicron

Estamos entrando no último mês do primeiro ano da terceira década do século 21. Onde estamos? Sabemos quem somos individualmente e ou coletivamente? Temos alguma ideia de como será o caminho civilizatório da terceira década deste século? O que aprendemos em 2021? O que mudou? Quais são as verdades que adquirimos, quais foram ressignificadas e quais foram confirmadas?

Todas essas verdades são a nossa necessidade de ter explicações para tudo. Por que precisamos de explicações? Por que acreditamos nas explicações? Será que escolhemos em quais explicações acreditar ou somos levados a acreditar? Por que, geralmente, acreditamos em apenas uma das explicações?

“Toda verdade passa por três estágios.
  No primeiro, ela é ridicularizada.
  No segundo, é rejeitada com violência.
  No terceiro, é aceita como evidente por si própria”. Arthur Schopenhauer

Esse trecho todo acima foi copiado e atualizado do texto inicial de primeiro de dezembro de 2020.

Será que depois de 20 meses de pandemia continuamos a acreditar no inacreditável e nos comportar da mesma maneira? O pior que pode nos acontecer é voltarmos ao que éramos em 2019 e, no entanto, muita gente está procurando caminhar para essa direção. Voltar ao normal ou para um novo normal, não é normal… é Normose! Normose é “um conjunto de hábitos considerados normais pelo consenso social que, na realidade, são patogênicos e nos levam à infelicidade, à doença e à perda de sentido na vida”, essa patologia é definida por Roberto Crema, Jean-Yves Leloup e Pierre Weil em seu livro – Normose: A patologia da normalidade – veja o TED do Roberto Crema que recomendei em outubro do ano passado: http://bit.ly/TEDnormose

Esse mês de novembro aconteceu o que deveria ter sido um momento decisivo (turning point) nas questões climáticas, a COP26. Na verdade o que aconteceu, na parte oficial, foram os negócios como de costume (business as usual) e qualquer possibilidade de se firmar algo mais concreto foi deixado para o ano que vem no Egito.     

O que ficou evidenciado nessa COP26 foi a procrastinação dos líderes mundiais. Evidenciou que ninguém realmente se importa em prometer o que não tem intenção de cumprir. Algo raro na política? Ficou claro também que não há razão de se fazer as próximas COPs com os líderes dos países, sejam presidentes, ministros ou outras pessoas das imensas e inúteis delegações que viajam uma vez por ano… para nada! O Brasil tinha a maior delegação do mundo, até mais do que o Reino Unido. Foram 479 membros inscritos, pelo Brasil, oficialmente na ONU. Desses, pelo menos 57 não pertencem a nenhum governo federal, estadual ou municipal, são empresários e representantes de associações corporativas, ligados à indústria e ao agronegócio. Entre todos esses inscritos na comitiva brasileira não há ONGs, ambientalistas, cientistas, pesquisadores, movimentos sociais ou organizações indígenas. O embaixador Paulino Franco, disse à Folha quando questionado sobre a recusa no credenciamento de ONGs que “A delegação oficial não pode incluir representantes que não são do governo.” Era melhor ter ficado quieto!

Quem se deu bem foi a indústria dos combustíveis fósseis que enviaram mais de 500 delegados (quando li isso achei que era fake news) para fazer lobby em todas as salas de negociação. Se isso é permitido numa COP… para que servem as COPs? – aliás minha grande pergunta. A grande diferença dessa COP para as anteriores é que por ter sido durante essa pandemia ficou claro que dá sim para “alterar o mundo todo”. A grande questão que se dizia nas COPs anteriores era de que não dava para “parar” o mundo. Dá sim!! O draft do texto final já era um conto da Carochinha… eles tiveram ainda que “suavizar” para o texto final. Como assim???? Mudanças como “eliminação gradual” para “redução gradual”.

Como sempre tivemos duas COP26. A primeira da ZONA Azul (Blue Zone) que foi o fiasco de sempre regado a algumas poucas intervenções maravilhosas como a da nossa indígena Txai Suruí (publiquei o discurso dela no texto do mês passado) que fez parte da abertura no dia 1 de novembro. Veja aqui a entrevista no Roda Viva dessa última segunda com ela e seu pai Almir Suruí.

A sociedade civil por outro lado se posicionou maravilhosamente bem todos os dias. Principalmente os jovens e as comunidades indígenas. São heróis que conseguiram a duras penas viajar até lá, encontrar onde ficar, arcar com os altos custos da estadia e enfrentar a superlotação de espaços oficiais que não comportavam o grande número de participantes. Foram eles que tomaram as ruas e os espaços alternativos para finalmente tornar Glascow uma razão de ser.

 O resultado final precisaria entrar item por item (Mitigação, Adaptação, Finanças, Perdas e Danos e alguns outros como o artigo 6 do Acordo de Paris), o que já foi muito bem feito pela mídia especializada desde o início da COP26.  Teve alguns poucos avanços que precisamos celebrar e muitos retrocessos que dessa vez ficaram evidentes. A COP21 de Paris foi camuflada fingindo ter sido um sucesso quando na verdade foi um fracasso retumbante para o meio ambiente. O sucesso de Paris foi diplomático e novamente pergunto “para que servem as COPs?”

E o Brasil com seu imenso stand para ironicamente mostrar um “Brasil real”. Ninguém caiu nessa e os verdadeiros protagonistas desse Brasil real foram os cientistas, ativistas, pesquisadores, jornalistas ambientais e institutos com grande credibilidade. Um ponto bem positivo para o Observatório do Clima que mobilizou mais de 200 entidades idôneas do Brasil e foi um farol da atuação brasileira em Glascow. Na sexta que deveria ser o encerramento, cada país falou do seu posicionamento em relação ao rascunho do texto (Brasil focou no artigo sexto do acordo de Paris). Logo após a fala dos representantes dos países havia uma calorosa salva de palmas. Venezuela não foi aplaudida e ficou um silêncio constrangedor. Depois que o Brasil falou também não teve aplauso… senti muita vergonha! Para não dizer que não falei das flores, o Brasil teve alguns momentos bons (acredito que foi fruto de um Itamaraty mais autônomo) como a assinatura de redução das emissões de metano em 30% até 2030. Isso vai afetar significativamente a indústria da proteína no Brasil. Ainda não sei como conseguiram que assinássemos isso. Num primeiro momento me surpreendeu positivamente e depois quando ficou claro que o governo escondeu os números da taxa do desmatamento do INPE que saiu apenas em 18 de novembro quando já estavam prontos em 27 de outubro… pareceu mais uma manobra para (literalmente) inglês ver.

A Relação direta entre as causas do COVID e as Emergências Climáticas na COP26 ficou bem definida em vários grupos de trabalho, a meu ver, não deixando mais dúvidas sobre a relação direta entre eles e numa visão de futuro das pandemias.

E o COVID na COP26? Esse é um assunto mantido a sete chaves pelo governo do Reino Unido e pela maioria dos países e até mesmo por entidades participantes. Não é um assunto que queremos incluir na pauta de uma agenda. E quanto a variante Ômicron? Teria o evento em Glascow ajudado a espalhar? A primeira-ministra da Escócia, Nicola Sturgeon, acredita que não, mas diz que não ser impossível devido as datas. Acredito que há poucas chances de a COP26 não ter sido um fator de espalhar a variante Ômicron entre os países. Primeiro porque quem estava lá percebeu as falhas nas medidas de segurança para contenção do coronavírus. Entre elas os testes rápidos (lateral flow test) que muitos testaram negativo e quando testaram para embarcar estavam positivos. Além disso os testes não providenciam o sequenciamento genômico para saber de que vírus se trata. Somente exames posteriores é possível verificar isso. Os números oficiais de infectados são apenas 291. Isso é tão longe da verdade que espero que o governo Escocês libere os números reais num relatório que prometeram entregar em dezembro. Eles têm o número real. Novamente, entre as consequências negativas do encontro de Glascow estão a possibilidade de disseminação da COVID entre os países participantes. É uma questão sistêmica que não pode ser vista apenas localmente e as autoridades do Reino Unido querem nos convencer apenas com as medidas locais do evento. Um exemplo da falta de um olhar sistêmico para a segurança sanitária em Glascow foi a situação escandalosa de Gleneagles, um hotel de luxo que recebeu mais de 30 delegações internacionais para a COP26, entre elas Suíça, Espanha, Noruega e Korea do Sul. A empresa responsável contratada pela segurança alojou o pessoal da segurança em quartos com 40 pessoas dormindo e comendo lado a lado numa cama de camping com nenhum cuidado (e parece que nem foram testados).

Ontem o Reino Unido confirmou 22 contaminados com a Variante Ômicron, Botswana 19, Holanda 14, Portugal 13, Dinamarca 5, Alemanha 4, Brasil 3, Noruega 2 e Estados Unidos 1. Na África do sul há mais de 100 casos verificados. Fica claro que há muito mais que não foram relatados ainda simplesmente porque o sequenciamento genômico não consegue ainda detectar. Claro que ainda, também, não conseguem saber qual o real perigo que essa nova variante está trazendo.  

Se as realizações em Glascow forem medidas por declarações de que onde há floresta há pobreza, ou que a redução do gás metano será através de reduzir a vida do boi em um ano… será difícil caminharmos numa direção onde a humanidade seja contemplada.

Para finalizar gostaria de repetir que a COP26 evidenciou é o total despreparo e desinteresse dos líderes de governo, com raras exceções, em promover ações que realmente alterem o rumo do desastre em que nossa civilização está se autodestruindo. Eles continuam a procrastinar como se fosse possível fingir que não é com eles. Chegaram ao poder através das mãos das indústrias que mais contribuem com a catástrofe… que mais poderiam fazer do que protegerem seus interesses? Para piorar esses pseudo líderes causam distração do que realmente deveria ser negociado. A mídia corre atrás deles como se fossem astros de cinema e lhes dão uma cobertura que une o inútil ao desagradável. Com tudo isso fica difícil para a população global deixarem de ser reféns cúmplices de uma aceleração na degradação da humanidade. É o que a Hannah Arendt chamou de “banalidade do mal”, ou seja, precisa ser muito desavisado para comprar ações da indústria do petróleo, da proteína, da agricultura predadora. Desavisado por investir numa indústria que irá se extinguir. Desavisado, caso pense no curto prazo, por estar contribuindo com o eminente desastre e querendo lucrar em detrimento do futuro.

Acredito que entre todas as coisas que podemos fazer como indivíduos, como família, como cidadãos é quanto a Educação para Sustentabilidade para que a próxima geração tenha consciência e saiba o que esteja fazendo com a nossa humanidade.

Vou deixar, mais uma vez uma das frases do David Attenborough na abertura da COP26:

  “Em minha vida, testemunhei um declínio terrível. Na sua, você poderia – e deveria – testemunhar uma recuperação maravilhosa.”

Primeiro de Novembro

Hoje é Dia de Todos os Santos, acredito que vamos precisar muito deles além de outras entidades para apoiar as ações de regeneração diante dessa crise civilizatória.

Ontem começou a cúpula da COP26 e hoje tivemos uma abertura absolutamente emocionante e gerando, em mim, muita esperança… esperança do verbo esperançar.

O ponto alto foi a fala do David Attenborough, 95 anos, que convocou a todos para uma recuperação maravilhosa das mudanças climáticas. O mais querido e conhecido ativista ambiental do planeta discursou para uma audiência de líderes mundiais – incluindo Joe Biden, Angela Merkel e Boris Johnson – dizendo que deveria ser possível trabalhar juntos para salvar a humanidade. Cada frase sua foi de grande impacto. Destaco três delas:

 “Em minha vida, testemunhei um declínio terrível. Na sua, você poderia – e deveria – testemunhar uma recuperação maravilhosa.”

“Hoje, aqueles que menos fizeram para causar este problema estão sendo os mais atingidos – em última análise, todos nós sentiremos os impactos, alguns dos quais agora são inevitáveis.”

“As pessoas que vivem agora, que são a geração futura, olharão para esta conferência e considerarão uma coisa que esse número parou de aumentar e começou a cair como resultado das decisões tomadas aqui?”

O filme “Earth to COP” foi eficaz em seu objetivo de levar consciência aos participantes e a audiência mundial.

A nossa ativista indígena Txai Suruí, também, discursou na abertura da COP26 desta manhã (no Brasil). Ela é uma jovem ativista de 24 anos e mora no estado de Rondônia, Brasil. Ela é do povo Paiter Suruí e fundadora do Movimento da Juventude Indígena em Rondônia.

 Seu discurso:

“Meu nome é Txai Suruí, eu tenho só 24, mas meu povo vive há pelo menos 6 mil anos na floresta Amazônica. Meu pai, o grande cacique Almir Suruí me ensinou que devemos ouvir as estrelas, a Lua, o vento, os animais e as árvores. Hoje o clima está esquentando, os animais estão desaparecendo, os rios estão morrendo, nossas plantações não florescem como antes. A Terra está falando. Ela nos diz que não temos mais tempo. Uma companheira disse: vamos continuar pensando que com pomadas e analgésicos os golpes de hoje se resolvem, embora saibamos que amanhã a ferida será maior e mais profunda? Precisamos tomar outro caminho com mudanças corajosas e globais. Não é 2030 ou 2050, é agora! Enquanto vocês estão fechando os olhos para a realidade, o guardião da floresta Ari Uru-Eu-Wau-Wau, meu amigo de infância, foi assassinado por proteger a natureza. Os povos indígenas estão na linha de frente da emergência climática, por isso devemos estar no centro das decisões que acontecem aqui. Nós temos ideias para adiar o fim do mundo. Vamos frear as emissões de promessas mentirosas e irresponsáveis; vamos acabar com a poluição das palavras vazias, e vamos lutar por um futuro e um presente habitáveis. É necessário sempre acreditar que o sonho é possível. Que a nossa utopia seja um futuro na Terra. Obrigada!”

A fala do secretário-geral da ONU, Antonio Guterres foi muito contundente. Disse que os líderes mundiais sabem o que fazer, “sirenes estão tocando, o planeta está nos dizendo algo, as pessoas também”.

Essas próximas duas semanas serão de muito trabalho para todos que buscam resultados gerativos e eficazes desse encontro.

Assistam! Assistam! Assistam a abertura de hoje! https://youtu.be/oofxDQQKE7M

Hoje foi um dia de trabalho virtual intenso na COP26 e de muita alegria em encontrar minha cara metade depois de mais de um mês de retiro concentrado no meu livro.

Vamos esperançar que os líderes mundiais e a sociedade civil consigam um entendimento inédito com ações objetivas reais, reconhecendo nossa interdependência. Que o Brasil consiga se livrar dessa terrível caminhada de destruição socioambiental desses últimos dez anos e principalmente dos últimos três. Essa é a década decisiva e os resultados tangíveis dessa COP26 vão refletir se o mundo vai trabalhar em conjunto ou continuarão acreditando nas suas fronteiras imaginárias denominadas: países. Somos um!